Trilussa: Três momentos
Carlo Alberto Salustri, (Roma, Itália, 26 de outubro de 1871 — Roma, Itália, 21 de dezembro de 1950)
Poeta satírico italiano, Trilussa (anagrama do seu sobrenome), conhecido e aplaudido em todo o mundo, principalmente no Brasil, na década de 30 do século passado. Sua ironia mordaz não poupava as vaidades e as pretensões humanas do seu tempo, evidentes e reconhecíveis sob a máscara de bichos humanos e selváticos. Advogados, magistrados, diplomatas, religiosos, políticos, governantes e governados – eram o alvo certeiro de suas sátiras bem imaginosas, escritas em dialeto romanesco, uma espécie de gíria da capital italiana.
ORGANIZANDO O MINISTÉRIO
Quando à "Raposa" que tem um tino sério,
lhe deram a incumbência delicada
de compor como quisesse o ministério,
naturalmente sentiu-se muito honrada.
E os animais empenhou-se a convocar.
Porém o Porco ela não mandou chamar
pois disse a muito astuta com fineza:
"- Não convém…que ele é tão falto de limpeza!…"
"Tens razão" lhe disse o Cão que estava ao lado,
além de sujo, nojento e desastrado,
tem um outro inconveniente todavia,
pois se ao governo ele for, assim, levado,
ficará sempre com ele…a maioria!…
(traduzido por Breno Di Grado)
AO PÉ DA LETRA
– Como te chamas? – Jão Apollinario
– Idade? – Trinta. – Estado? – Sou casado.
– A tua profissão? – Desocupado.
– Como vives? – Do modo mais precário.
– Que fazia teu pai? – Tudo ao contrário.
– Como assim? – É que ao mundo, fui lançado
Quando meu pai estava encarcerado:
Eu sou filho de um erro judiciário.
– Como explicar então que fosse visto
De uma igreja saindo, de surpresa,
Depois de haver furtado um Jesus Cristo?
– Um crucifixo de ouro, seu doutor?
– Sim, que vais alegar em tua defesa?
– Que se respeite um livre pensador.
(tradução: Paulo Duarte)
O GATO SOCIALISTA
Um gato que bancava o socialista
com o fim de chegar a deputado,
estava comendo um frango assado
na cozinha de um capitalista.
Outro gato, com lógica sectária,
disse-lhe desde a borda de um postigo:
– "Pensa que eu também, querido amigo,
pertenço à mesma classe proletária.
E bem sei que, se numas revoadas,
eu descer, esse frango que dispões
o partirás já já em duas rações
pois não somos, debalde camaradas".
– "Ah, não!" – disse o outro sem pudor –
"Eu não divido nada, ó meu artista,
porque, se em jejum sou socialista,
comendo, sempre sou conservador!".
(traduzido por CARLO PRINA)