Revista Virtual de Artes, com ênfase na pintura do século XIX

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Trovas de muito amor…

2.Jules Girardet (french, 1856-1938)

Trovas de muito amor

Amo e conheço.
Eis porque sou amante
e vos mereço.

De entendimento
Vivo e padeço.

Vossas carências
Sei-as de cor.
E o desvario
Na vossa ausência
Sei-o melhor

Tendes comigo
Tais dependências
Mas eu convosco
Tantas ardências
Que só me resta
O amar antigo:
Não sei dizer-vos
Amor, amigo
Mas é nos versos
Que mais vos sinto
E na linguagem
Desta canção

Sei que não minto.

HILDA HILST

Pintura: Jules Girardet (França, 1856-1938)


Três momentos: Cecília Meireles

cc curran 1922

CANÇÃO EXCÊNTRICA

Ando à procura de espaço
para o desenho da vida.
Em números me embaraço
e perco sempre a medida.
Se penso encontrar saída,
em vez de abrir um compasso,
protejo-me num abraço
e gero uma despedida.

Se volto sobre o meu passo,
é já distância perdida.

Meu coração, coisa de aço,
começa a achar um cansaço
esta procura de espaço
para o desenho da vida.
Já por exausta e descrida
não me animo a um breve traço:
– saudosa do que não faço,
– do que faço, arrependida.

Pintura: Charles Courtney Curran (EUA, 1861-1942)


William Henry Margetson (british, 1861-1940)-castles of sand -1898

APRESENTAÇÃO

Aqui está minha vida – esta areia tão clara
com desenhos de andar dedicados ao vento.

Aqui está minha voz – esta concha vazia,
sombra de som curtindo o seu próprio lamento.

Aqui está minha dor – este coral quebrado,
sobrevivendo ao seu patético momento.

Aqui está minha herança – este mar solitário,
que de um lado era amor e, do outro, esquecimento.

Pintura: William Henry Margetson (Inglaterra, 1861-1940)


MaxfieldParrish-reveries
REINVENÇÃO

A vida só é possível reinventada.
Anda o sol pelas campinas e passeia a mão dourada pelas águas, pelas folhas. . .
Ah! Tudo bolhas que vêm de fundas piscinas de ilusionismo… – mais nada.
Mas a vida, a vida, a vida, a vida só é possível reinventada.
Vem a lua, vem, retira as algemas dos meus braços.
Projeto-me por espaços cheios da tua Figura.
Tudo mentira! Mentira da lua, na noite escura.
Não te encontro, não te alcança…
Só – no tempo equilibrada, desprendo-me do balanço que além do tempo me leva.
Só – na trevas fico: recebida e dada.
Porque a vida, a vida, a vida, a vida só é possível reinventada.

Ilustração: Maxfield Parrish (EUA, 1870 – 1966)


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Cecília Meireles, escritora. (Foto da Folhapress) (Foto: Folhapress)

Cecília Benevides de Carvalho Meireles

(Rio de Janeiro, 7 de novembro de 1901 — Rio de Janeiro, 9 de novembro de 1964)
Poetisa, pintora, professora e jornalista brasileira.